Tema da semana:
“O CONSOLADOR PROMETIDO” de 30/01/2012 a 05/02/2012
Humberto de Campos
Avizinhando-se
o Natal, havia também no Céu um rebuliço de alegrias suaves. Os Anjos acendiam
estrelas nos cômodos de neblinas douradas e vibravam no ar as harmonias
misteriosas que encheram um dia de encantadora suavidade a noite de Belém. Os
pastores do paraíso cantavam e, enquanto as harpas divinas tangiam suas cordas
sob o esforço caricioso dos zéfiros da imensidade, o Senhor chamou o Discípulo
Bem-Amado ao seu trono de jasmins matizados de estrelas.
O vidente
de Patmos não trazia o estigma da decrepitude como nos seus últimos dias entre
as Espórades. Na sua fisionomia pairava aquela mesma candura adolescente que o
caracterizava no princípio do seu apostolado.
- João –
disse-lhe o Mestre – lembras-te do meu aparecimento na Terra?
-
Recordo-me, Senhor. Foi no ano 749 da era romana, apesar da arbitrariedade de
Frei Dionísios, que colocou erradamente o vosso natalício em 754.
- Não,
meu João – retornou docemente o Senhor – não é a questão cronológica que me
interessa em te argüindo sobre o passado. É que nessas suaves comemorações vem
até mim o murmúrio doce das lembranças!...
- Ah!
Sim, Mestre Amado – retrucou pressuroso o Discípulo – compreendo-vos. Falais da
significação moral do acontecimento. Oh!...Se me lembro... A manjedoura, a
estrela guiando os poderosos ao estábulo humilde, os cânticos harmoniosos dos
pastores, a alegria ressoante dos inocentes, afigurando-se-nos que os animais
vos compreendiam mais que os homens, aos quais ofertáveis a lição da humildade
com o tesouro da fé e da esperança. Naquela noite divina, todas as potências
angélicas do paraíso se inclinaram sobre a Terra cheia de gemidos e de amargura
para exaltar a mansidão e a piedade do Cordeiro. Uma promessa de paz
desabrochava para todas as coisas com o vosso aparecimento sobre o mundo.
Estabelecera-se um noivado meigo entre a Terra e o Céu e recordo-me do júbilo
com que Vossa Mãe vos recebeu nos seus braços feitos de amor e de misericórdia.
Dir-se-ia, Mestre, que as estrelas de ouro do paraíso fabricaram, naquela noite
de aromas e de radiosidades indefiníveis um mel divino no coração piedoso de
Maria!...
Retrocedendo
no tempo, meu Senhor bem-amado, vejo o transcurso da vossa infância, sentindo o
martírio de que fostes objeto; o extermínio das crianças de Vossa idade, a fuga
nos braços carinhosos da Vossa progenitora, os trabalhos manuais em companhia
de José, as vossas visões maravilhosas no Infinito, em comunhão constante com o
Vosso e nosso Pai, preparando-Vos para o desempenho da missão única que Vos fez
abandonar por alguns momentos os palácios de sol da mansão celestial para
descer sobre as lamas da Terra.
- Sim,
meu João, e, por falar nos meus deveres, como seguem no mundo as coisas
atinentes à minha doutrina?
- Vão
mal, meu Senhor. Desde o concílio ecumênico de Nicéia, efetuado para combater o
cisma de Ario em 325, as vossas verdades são deturpadas. Ao arianismo seguiu-se
o movimento dos iconoclastas em 787 e tanto contrariaram os homens o Vosso
ensinamento de pureza e de simplicidade, que eles próprios nunca mais se
entenderam na interpretação dos textos evangélicos.
- Mas não
te recordas, João, que a minha doutrina era sempre acessível a todos os
entendimentos? Deixei aos homens a lição do caminho, da verdade e da vida sem
lhes haver escrito uma só palavra.
- Tudo
isso é verdade, Senhor, mas logo que regressastes aos vossos impérios
resplandecentes, reconhecemos a necessidade de legar à posteridade os vossos
ensinamentos. Os evangelhos constituem a vossa biografia na Terra; contudo, os
homens não dispensam, em suas atividades, o véu da matéria e do símbolo. A
todas as coisas puras da espiritualidade adicionam a extravagância de suas
concepções. Nem nós e nem os evangelhos poderíamos escapar. Em diversas
basílicas de Rávena e de Roma, Mateus é representado por um jo0vem, Marcos por um
leão, Lucas por um touro e eu, Senhor, estou ali sob o símbolo estranho de uma
águia.
- E os
meus representante, João, que fazem eles?
- Mestre,
envengonho-me de o dizer. Andam quase todos mergulhados nos interesses da vida
material. Em sua maioria, aproveitam-se das oportunidades para explorar o vosso
nome e, quando se voltam para o campo religioso, é quase que apenas para se
condenarem uns aos outros, esquecendo-se de que lhes ensinastes a se amarem
como irmãos.
- As
discussões e os símbolos, meu querido – disse-lhe suavemente o Mestre – não me
impressionam tanto. Tiveste, como eu, necessidade destes últimos, para as
predicações e, sobre a luta das idéias, não te lembras quanta autoridade fui
obrigado a despender, mesmo depois da minha volta da Terra, para que Pedro e
Paulo não se tornassem inimigos? Se entre meus apóstolos prevaleciam
semelhantes desuniões, como poderíamos eliminá-las do ambiente dos homens, que
não me viram, sempre inquietos nas suas indagações? ... O que me contrista é o
apego dos meus missionários aos prazeres fugitivos do mundo!
- É
verdade, Senhor.
- Qual o
núcleo de minha doutrina que detém no momento maior força de expressão?
- É o
departamento dos bispos romanos, que se recolheram dentro de uma organização
admirável pela sua disciplina, mas altamente perniciosa pelos seus desvios da
verdade. O Vaticano, Senhor, que não conheceis, é um amontoado suntuoso das
riquezas das traças e dos vermes da Terra. Dos seus palácios confortáveis e
maravilhosos irradia-se todo um movimento de escravização das consciências.
Enquanto vós não tínheis uma pedra onde repousar a cabeça, dolorida os vossos
representantes dormem a sua sesta sobre almofadas de veludo e de ouro; enquanto
trazíeis os vossos pés macerados nas pedras do caminho escabroso, quem se
inculca como vosso embaixador traz a vossa imagem nas sandálias matizadas de
pérolas e de brilhantes. E junto de semelhantes superfluidades e absurdos,
surpreendemos os pobres chorando de cansaço e de fome; ao lado do luxo
nababesco das basílicas suntuosas, erigidas no mundo como um insulto à glória
da vossa humildade e do vosso amor, choram as crianças desamparadas, os mesmos
pequeninos a quem estendíeis os vossos braços compassivos e misericordiosos.
Enquanto sobram as lágrimas e os soluços entre os infortunados, nos templos,
onde se cultua a vossa memória, transbordam moedas em mãos cheias, parecendo,
com amarga ironia, que o dinheiro é uma defecação do demônio no chão acolhedor
da vossa casa.
- Então,
meu Discípulo, não poderemos alimentar nenhuma esperança?
-
Infelizmente, Senhor, é preciso que nos desenganemos. Por um estranho
contraste, há mais ateus benquistos no Céu do que aqueles religiosos que
falavam em vosso nome na Terra.
-
Entretanto – sussurraram os lábios divinos docemente – consagro o mesmo amor à
humanidade sofredora. Não obstante a negativa dos filósofos, as ousadias da
ciência, o apodo dos ingratos, a minha piedade é inalterável... Que sugeres,
meu João, para solucionar tão amargo problema?
- Já não
dissestes, um dia, Mestre, que cada qual tomasse a sua cruz e vos seguisse?
- Mas
prometi ao mundo um Consolador em tempo oportuno!...
E os
olhos claros e límpidos, postos na visão piedosa do amor de seu Pai Celestial,
Jesus exclamou:
- Se os
vivos nos traíram, meu Discípulo Bem-Amado, se traficam com o objeto sagrado da
vossa casa, profligando a fraternidade e o amor, mandarei que os mortos falem
na Terra em meu nome. Deste Natal em diante, meu João, descerrarás mais um
fragmento dos véus misteriosos que cobrem a noite triste dos túmulos para que a
verdade ressurja das mansões silenciosas da Morte. Os que já voltaram pelos
caminhos ermos da sepultura retornarão à Terra para difundirem a minha
mensagem, levando aos que sofrem, coma esperança posta no Céu as claridades
benditas do meu amor!...
E desde
essa hora memorável, há mais de cinqüenta anos, o Espiritismo veio, com as suas
lições prestigiosas, felicitar e amparar na Terra a todas as criaturas.
Pedro Leopoldo 20 de dezembro de 1935.
Do livro “Palavras do Infinito”.
Psicografia de Francisco Cândido Xavier.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
(-: , Olá, seja bem vindo, se o seu comentário for legal, e não trouxer conteúdo agressivo, ele será postado.