Tema da semana
“Todo
aquele que se eleva será rebaixado ”
de 20/08/2012 a
26/08/2012
Neio Lúcio
No tempo em que não
havia automóveis, na cocheira de famoso palácio real um burro de
carga curtia imensa amargura, em vista das pilhérias e remoques dos
companheiros de apartamento.
Reparando-lhe o pelo
maltratado, as fundas cicatrizes do lombo e a cabeça tristonha e
humilde, aproximou-se formoso cavalo árabe, que se fizera detentor
de muitos prêmios, e disse, orgulhoso:
- Triste sina a que
recebeste! Não Invejas minha posição nas corridas? Sou acariciado
por mãos de princesas e elogiado pela palavra dos reis!
- Pudera! - exclamou um
potro de fina origem inglesa - como conseguirá um burro entender o
brilho das apostas e o gosto da caça?
O infortunado animal
recebia os sarcasmos, resignadamente.
Outro soberbo cavalo, de
procedência húngara, entrou no assunto e comentou:
- Há dez anos, quando me
ausentei de pastagem vizinha, vi este miserável sofrendo rudemente
nas mãos de bruto amansador. É tão covarde que não chegava a
reagir, nem mesmo com um coice. Não nasceu senão para carga e
pancadas. É vergonhoso suportar-lhe a companhia.
Nisto, admirável jumento
espanhol acercou-se do grupo, e acentuou sem piedade:
- Lastimo reconhecer
neste burro um parente próximo. É animal desonrado, fraco,
inútil... Não sabe viver senão sob pesadas disciplinas. Ignora o
aprumo da dignidade pessoal e desconhece o amor-próprio. Aceito os
deveres que me competem até o justo limite; mas, se me constrangem a
ultrapassar as obrigações, recuso-me à obediência, pinoteio e sou
capaz de matar.
As observações
insultuosas não haviam terminado, quando o rei penetrou o recinto,
em companhia do chefe das cavalariças.
- Preciso de um animal
para serviço de grande responsabilidade - informou o monarca -,
animal dócil e educado, que mereça absoluta confiança.
O empregado perguntou:
Não prefere o árabe,
Majestade?
- Não, não - falou o
soberano -, é muito altivo e só serve para corridas em festejos
oficiais sem maior importância.
- Não quer o potro
inglês?
- De modo algum. E’
muito irrequieto e não vai além das extravagâncias da caça.
- Não deseja o húngaro?
- Não, não. É bravio,
sem qualquer educação. É apenas um pastor de rebanho.
- O jumento serviria? -
insistiu o servidor atencioso.
- De maneira nenhum. É
manhoso e não merece confiança.
Decorridos alguns
instantes de silêncio, o soberano indagou:
- Onde está o meu burro
de carga?
O chefe das cocheiras
indicou-o, entre os demais.
O próprio rei puxou-o
carinhosamente para fora, mandou ajaezá-lo com as armas
resplandecentes de sua Casa e confiou-lhe o filho, ainda criança,
para longa viagem.
Assim também acontece na
vida. Em todas as ocasiões, temos sempre grande número de amigos,
de conhecidos e companheiros, mas somente nos prestam serviços de
utilidade real aqueles que já aprenderam a suportar, servir e
sofrer, sem cogitar de si mesmos.
-*-
Abriga-te na humildade,
Não busque mundana
estima.
O ouro afunda no mar,
A palha fica por cima.
Regueira Costa
-*-
Nunca vejas no vizinho
Defeitos fraquezas,
taras...
A ostra mora no lodo
Criando pérolas raras.
Sabino Batista
-*-
Quem não deseja
suportar, é incapaz de servir.
André Luiz
Do livro Ideias e
Ilustrações. Psicografia de Francisco Cândido Xavier.
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